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Conheça o programa secreto de Israel que pode ter 90 bombas atômicas

País nunca confirmou oficialmente a existência do arsenal, tampouco assinou o Tratado de Não Proliferação de Armas Nucleares

Foto: Reprodução/Freepik

 

Apesar de condenar a possibilidade de o Irã desenvolver armas nucleares, Israel é apontado há décadas como detentor de um programa atômico próprio, mantido sob sigilo e fora do alcance da fiscalização internacional. Estimativas da Federação de Cientistas Americanos e da Associação de Controle de Armamentos, ambas dos Estados Unidos, indicam que o Estado judeu possui ao menos 90 ogivas nucleares, embora outras fontes mencionem até 300 bombas. As informações são de reportagem da agência Brasil.

O país nunca confirmou oficialmente a existência do arsenal, tampouco assinou o Tratado de Não Proliferação de Armas Nucleares (TNP), o que o torna o único do Oriente Médio a manter essa postura e o exime de inspeções da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), contrariando apelo feito pelo Conselho de Segurança da ONU ainda em 1981.

A construção da infraestrutura nuclear israelense remonta aos anos 1950. Segundo o historiador Luiz Alberto Moniz Bandeira, autor de A Segunda Guerra Fria, Israel iniciou seu programa secreto com apoio da Comissão de Energia Atômica da França e utilizou a usina de Dimona, ao sul de Jerusalém, para produzir o material bélico.

A CIA teria descoberto a existência do programa apenas em 1961, embora suspeitas anteriores já circulassem. Fontes como o ex-presidente norte-americano Jimmy Carter declararam que Israel teria cerca de 150 ogivas, enquanto ex-integrantes da inteligência israelense relataram que o país chegou a fabricar bombas com capacidade três vezes superior às que destruíram Hiroshima e Nagasaki.

O cientista político Ali Ramos, especialista em geopolítica do Oriente Médio, sustenta que os Estados Unidos sempre souberam do programa e optaram por ignorá-lo. “Os EUA fizeram vista grossa. As agências de segurança sempre tiveram uma relação muito próxima com o lobby israelense”, afirmou. Ramos destacou que, diferentemente de outras potências nucleares, como EUA, Reino Unido e França, Israel opera completamente à margem das inspeções da ONU e da AIEA. “É o único programa nuclear no mundo que vive nesse limbo.”

Em 1986, o ex-técnico nuclear israelense Mordechai Vanunu revelou detalhes do programa atômico de Israel em entrevista ao jornal Sunday Times. Foi preso por traição e espionagem e passou 18 anos encarcerado, 11 deles em regime de solitária. Ao ser libertado em 2004, declarou que não se arrependia de ter feito a denúncia: “O que eu fiz foi informar o mundo sobre o que está acontecendo em segredo. Senti que isso não se tratava de traição.”

Desde 1981, o Conselho de Segurança da ONU mantém em vigor a resolução 487, aprovada após o bombardeio israelense ao reator iraquiano de Osirak. A norma condena o ataque e solicita que Israel submeta suas instalações à inspeção internacional, o que nunca ocorreu. Em 2009, a AIEA reiterou o pedido, novamente sem sucesso. O argumento israelense é de que cada Estado tem o direito soberano de decidir se adere ou não a tratados multilaterais.

O arsenal nuclear também teve papel estratégico nas guerras que marcaram a consolidação territorial de Israel. Em 1973, durante o ataque conjunto do Egito e da Síria para retomar os territórios ocupados por Israel em 1967, o então ministro da Defesa, general Moshe Dayan, colocou ogivas atômicas de prontidão. A medida visava pressionar os Estados Unidos a conter a reação soviética, demonstrando o poder de dissuasão nuclear que o país já detinha à época.

Para o professor Robson Valdez, do Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP), o apoio incondicional dado por potências ocidentais a Israel expõe um viés seletivo na aplicação do direito internacional. “Israel tem um programa nuclear que manipula à revelia da AIEA. Para os aliados, como Israel, há condescendência. Para os adversários, como o Irã, aplica-se todo o rigor da lei internacional.”

A manutenção de um programa secreto por parte de Israel, fora do alcance de inspeções internacionais, levanta questões sobre o equilíbrio de forças no Oriente Médio e a credibilidade das normas globais de não proliferação. A ausência de fiscalização em um dos arsenais mais opacos do planeta segue sendo tema de críticas entre analistas e diplomatas, à medida que o país reforça sua posição militar na região.