ECONOMIA


Ouro ultrapassa US$ 4 mil e expõe crise global de confiança nas moedas

Disparada do metal reflete o avanço das dívidas públicas, tensões geopolíticas e o enfraquecimento da credibilidade das políticas monetárias

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O ouro rompeu a marca inédita de US$ 4 mil por onça em 2025, reacendendo o debate sobre a solidez do sistema financeiro internacional. A escalada ocorre em meio ao aumento da desconfiança nas moedas fiduciárias, pressionadas por dívidas públicas que já ultrapassam 300% do PIB mundial, juros reais baixos e balanços inflados de bancos centrais. Para analistas, o movimento revela um “choque de confiança”: a escassez física do metal volta a falar mais alto que a fé nas promessas monetárias.

Segundo Lucas Collazo, Head de Cobertura de Ativos e Corretoras no Banco de Atacado da XP, o ouro reassume o papel de termômetro macroeconômico em cenário de instituições fragilizadas. Desde a pandemia, o metal deixou de ser apenas proteção financeira e passou a integrar estratégias de soberania nacional. Entre 2022 e 2024, bancos centrais compraram mais de 3 mil toneladas, o maior volume desde o fim do padrão-ouro. Em 2025, China, Turquia e Polônia lideram as aquisições para reduzir a dependência do dólar e blindar reservas.

O fenômeno é intensificado pela perda de força recente do dólar frente a outras moedas. Em ciclos anteriores, ouro e dólar subiam de forma inversamente proporcional; agora, o metal avança sozinho como principal fonte de preservação de valor. ETFs de ouro ao redor do mundo já somam mais de US$ 230 bilhões, com forte entrada de recursos da Índia e demanda consistente dos bancos centrais.

Embora analistas apontem sinais de superaquecimento, como queda no consumo de joias na China e na Índia, o cenário estrutural segue favorável ao ouro. O ambiente de juros reais comprimidos, tensões no Oriente Médio, o endividamento recorde dos EUA e a pressão política sobre o Federal Reserve alimentam a busca por ativos resistentes a choques. Somam-se a isso os efeitos do superciclo de investimentos em inteligência artificial: se o ritmo desacelerar, a aversão ao risco deve aumentar, favorecendo o metal. Em tempos de instabilidade global, o ouro volta a lembrar que parte da riqueza não depende de promessas, apenas de sua própria existência.