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Centrão: o pêndulo que joga xadrez enquanto esquerda e direita brincam de ‘par ou ímpar’

Texto de João Neto

Foto: Arquivo pessoal

 

Na coreografia política de Brasília, há um grupo que raramente perde o passo. Chamado genericamente de centrão — conglomerado de partidos como União Brasil, PP, Republicanos, PSD, Avante, Solidariedade, MDB, entre outros — essa força política não se guia por ideologias, mas por cálculos frios de poder. É o pêndulo que oscila não em função de convicções programáticas, mas da direção do vento no Palácio do Planalto.

O jogo é simples na forma, mas sofisticado na execução. A direita bolsonarista e a esquerda lulista se digladiam na arena ideológica, travando disputas simbólicas e narrativas para manter suas bases mobilizadas. Enquanto isso, o centrão observa. Mede. Calcula. E, com a paciência de um enxadrista profissional, decide para qual lado inclinar seu apoio — não por convicção, mas pela garantia de espaço, orçamento e influência.

Essa estratégia se traduz em um paradoxo público: líderes e presidentes de partidos como União Brasil, PP e PSD não hesitam em criticar duramente o governo federal, seja pela condução econômica, seja pela pauta de costumes. Ao mesmo tempo, ocupam pastas estratégicas na Esplanada, controlando orçamentos bilionários e moldando políticas públicas. É o pragmatismo na forma mais crua: a mão que atira pedras é a mesma que assina convênios e libera recursos.

Ao contrário do PL, que mantém sua bandeira atrelada ao bolsonarismo, ou do PT, que se ancora na defesa do lulismo, o centrão é maleável. Não se compromete com a temperatura das ruas nem com a retórica de palanque. Sua lógica é transacional: oferecer apoio em votações cruciais em troca de cargos, emendas e, sobretudo, influência sobre o fluxo orçamentário.

Na prática, isso significa que, enquanto PT e PL jogam “par ou ímpar” — um jogo rápido, de resultado imediato e previsível —, o centrão joga xadrez. Move peças com antecedência, sacrifica peões para ganhar posições e nunca se prende a um único tabuleiro. Sabe que, no fim, quem define a partida não é o discurso inflamado, mas o controle dos mecanismos que fazem a máquina pública funcionar.

O resultado é que, ciclo após ciclo eleitoral, o centrão permanece no centro das decisões, independentemente de quem vença no campo ideológico. A esquerda e a direita absorvem o desgaste da polarização, viram alvo de críticas e enfrentam a rejeição de metade do eleitorado. O centrão, frio e calculista, evita essa corrosão: sai do palco ideológico para atuar nos bastidores, onde os holofotes não cegam e o jogo é jogado com planilhas, números e articulação política milimétrica.

Se há um ensinamento que a política brasileira oferece, é que o poder raramente pertence aos que gritam mais alto — mas sim aos que sabem esperar o momento certo para mover a próxima peça. E nisso, convenhamos, o centrão é campeão invicto.

João Neto é guarda civil municipal classe distinta de Salvador de; instrutor; palestrante; graduado em gestão pública; MBA executivo em segurança privada: safety e security com especializações em contra espionagem industrial e empresarial, análise estruturada e planejamento estratégico; e enxadrista.